Longe de Jesus nós só conseguimos
uma grande angústia e um vazio crescente em nosso peito a ponto de alguns
momentos quase sufocar. É uma dor que não dói, o ar que respiramos não traz
vida, a comida não sacia, só vemos alvi-negro o arco íris, todas as vozes se
tornam ecos distantes de quem se perdeu de si mesmo.
Só gotas da infinita misericórdia
permitimos que nos atinja. Em cada gota descobrimos que está tudo, toda a vida,
todo o Amor, todos. Mas cabisbaixo por conta do egoísmo e da busca desenfreada
pelo pecado na ânsia de sanar o vazio, o mar em que nos encontramos é um fardo
pesadíssimo, quase impossível sobreviver.
E uma vez, esquecidos de nós,
atordoados e desnorteados somos visitados por uma breve consolação divina. Esta
consolação nos resgata de novo, fomenta e afervora o gélido coração.
Corremos de volta para nossa
pátria, nosso coração, e como filhos pródigos suplicamos os mais servis
trabalhos por conta da indignidade adquirida. É da acusação constante de nossos
pecados que nasce o desejo de não mais residir no coração do Pai, dignos
somente para Filhos; suplicamos então nos esconder em suas chagas causadas por
nós na esperança de suprimi-las e apagar tudo o que infligimos.
Descobrimos que elas não vão
embora, são profundas demais, sangram demais. Se nos fecharmos somente em nosso
falso desejo de sanar Suas santas chagas na expectativa de não precisar se
reconhecer mais um pródigo pecador, nos perdemos e a oportunidade de ver o
mundo por suas chagas abertas passa.
A visão daquele que se refugiou
nas chagas e que não impõe seu falso desejo de cura e de perfeição, onde, nunca
é possível a queda, o perdão e sangrar; é a visão da serenidade que é possível
se olharmos para Ele. Ele sofre, sim Ele sofre e como sofre, mas olhe para Ele,
o que foi feito deste sofrimento? Ele fez Amor, perdão, misericórdia, doação
total e livre de si.
Se de dentro das chagas olharmos nosso desejo de cura
instantânea, nunca entenderemos porque após a Ressurreição as chagas e os
estigmas permaneceram.
O máximo que conseguiremos é
admitir que foi para mostrar o que Ele fez, ou o que nós fizemos com Ele.
Assim, tornamos o seu ato salvífico em troféu da parte do Senhor ou pior, em
uma constante advertência e quem sendo bom sempre nos lembra de nossa maldade.
Jesus não sofre de narcisismo! Ele não contempla suas chagas e diz, vejam como
eu sou bom! Não, eu sou muito bom! Como um pavão, ou um galo de peito aberto,
cheio de si.
Não creio que seja assim...
O olhar das chagas alcançado de
um súplica ardente, fruto de um coração contrito, é aquele que descobre que o
Sangue que continua sendo derramado continuamente é a fonte da infinita
misericórdia. Esta fonte consola, nutre, afervora, acalenta, ama e perdoa. Entendemos
então que a ferida que causamos é a fonte da salvação, perdão não só para mim
que agora resido nela, mas a todos que se aproximam de sua misericórdia de
coração.
Estas chagas abertas são a constante possibilidade da
ofensa, mas a eterna concreção do perdão.
A constante possibilidade da
ofensa pertence à nossa liberdade para escolhermos se fazemos do pecado um
projeto de vida ou uma escada para o paraíso.
A eterna concreção do perdão se
deu na Cruz, no Altar do Calvário e pode ocorrer naqueles que escolhem se
tornarem como as chagas do Senhor, sempre abertas para perdoar e Amar o Amor
dos que amam o Senhor. Estes se tornam consolo para os que estão longe de si,
são como chamas que acalentam o coração dos que estão frios, são também odiados
por perpetuarem o Amor-perdão das chagas, principalmente pelos que aí residem e
anseiam por eliminá-las no anseio de vagarem pelo vale da perdição.
Ó refúgio bendito! Onde os que
Amam se tornam Amor. Eis a força das chagas abertas e Coração ferido de quem se
decidiu por ser o Amor que ama.
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